À medida que a
Volta a França Feminina 2025 entra nas suas etapas decisivas, Cedrine Kerbaol, da
EF Education-Oatly, deixou uma das mensagens mais marcantes da corrida e não tem nada a ver com classificações ou vitórias, mas com saúde a longo prazo.
A francesa de 24 anos, primeira ciclista do país a vencer uma etapa na era moderna da prova, aproveitou a sua visibilidade para alertar contra a crescente cultura de magreza extrema no ciclismo feminino do World Tour. “Não ter o período não é normal”, declarou em direto na France Télévisions após a Etapa 5. “Para além da fertilidade, há riscos sérios para a saúde óssea e para lesões graves. Antes de sermos atletas, somos mulheres. A nossa saúde importa, agora e no futuro.”
Além de ser uma trepadora de referência, Kerbaol é licenciada em dietética, o que dá ainda mais peso ao seu testemunho. Recentemente, ajudou a criar a iniciativa
@f.e.e.d_powr no Instagram, em conjunto com colegas e especialistas de saúde, para sensibilizar sobre a Deficiência Energética Relativa no Desporto (RED-S), disturbios alimentares e os riscos silenciosos da disfunção menstrual em atletas de alta competição.
“Há muitas pessoas que ganharam grandes corridas com pesos muito baixos”, explicou ao
L’Humanité. “As jovens olham para essas referências e tentam imitá-las. Vivemos numa era de enorme visibilidade: todas querem ser melhores, mais rápidas, produzir mais watts e pesar menos… Mas qual é o custo?”
Um aviso num momento crítico
As declarações de Kerbaol surgem pouco depois de uma entrevista anónima de um médico do World Tour à revista Knack, denunciando disturbios alimentares, manipulação de controlo de peso e falta de supervisão fora do ambiente de treino e competição.
“Algumas ciclistas enviam fotos de refeições que não comeram, ou da balança com o peso de outra pessoa”, revelou o denunciante. “Não pensam na saúde, só no desempenho. Dizem coisas como ‘Não quero ter filhos de qualquer forma’ ou ‘Osteoporose? Isso é para mais tarde’.”
Mesmo com acesso a equipas multidisciplinares de dietistas, ginecologistas, psicólogos e fisioterapeutas, o médico admitiu que o controlo é limitado fora das concentrações. “No dia-a-dia, em casa, torna-se muito mais difícil.”
Kerbaol venceu uma etapa da Volta a França Feminina em 2024
Entre watts e saúde
O pelotão feminino vive uma fase de crescente mediatismo e investimento, mas com a nova visibilidade surge também maior pressão. A obsessão por desempenho (medido em watts, peso e resultados) tem levado muitas ciclistas a arriscar a saúde para alcançar padrões quase impossíveis.
É neste contexto que a voz de Kerbaol ganha relevância: combina experiência no topo do mundo do ciclismo, formação científica e coragem para desafiar uma cultura que muitas vezes silencia os alertas internos. A sua mensagem ecoa como um lembrete de que o sucesso imediato não pode custar o futuro das atletas.