É oficial. Depois de semanas de especulação, a UAE Team Emirates – XRG confirmou que Tadej Pogacar fará a sua estreia na Paris-Roubaix em 2025. O esloveno, que já enverga a Camisola Arco-Íris de campeão do mundo, alinhará na Rainha das Clássicas com ambições claras: ganhar. Antes disso, competirá também na Volta à Flandres, no fim de semana anterior.
Para os adeptos do ciclismo, estamos perante algo verdadeiramente sem precedentes: uma tripla coroa – vencedor da Volta a França, campeão do mundo e múltiplo vencedor de Monumentos – a testar-se na corrida mais brutal do calendário profissional.
“Vi o brilho nos olhos dele”, revelou Aart Vierhouten, diretor desportivo da UAE, ao recordar o momento em que Pogacar tomou a decisão. “Foi aí que percebi: sim, ele quer mesmo isto. Ele disse: ‘Vou correr’.”
É a pergunta inevitável. E, como quase tudo no ciclismo, a resposta depende de vários factores: histórico, condição física, experiência e gestão do risco.
Segundo o jornalista Jonas Creteur, são poucos os campeões da Volta a França que ousaram desafiar os paralelos de Roubaix:
Isto significa que há mais de 40 anos que um vencedor do Tour não vence a Roubaix, e mesmo alinhar à partida é algo raríssimo.
A estreia em Roubaix será parte de uma campanha ambiciosa: Pogacar quer disputar os cinco Monumentos numa só temporada. É algo que poucos ciclistas conseguiram nas últimas décadas:
Mas Pogacar vai mais longe: quer vencê-los todos. Já soma triunfos na Volta à Flandres (2023), Liège-Bastogne-Liège (2021 e 2024) e Il Lombardia (2021, 2022, 2023 e 2024). Restam-lhe Milan-Sanremo (onde foi 3.º em 2023 e 2025) e a própria Paris-Roubaix, que nunca correu.
Se conquistar esses dois, entra num clube restrito com Rik Van Looy, Eddy Merckx e Roger De Vlaeminck: os únicos ciclistas da história a vencer os cinco Monumentos.
Roubaix não é vencida apenas com números. É uma corrida onde contam posicionamento, controlo, sorte e capacidade de enfrentar o caos. São mais de 50 km de paralelos, com setores icónicos como a Trouée d'Arenberg, Mons-en-Pévèle e o Carrefour de l’Arbre.
As quedas e os furos são decisivos. Mesmo os mais fortes podem ver a corrida fugir-lhes por um detalhe — como Wout van Aert, em 2023. A preparação da equipa é crucial. Um furo sem apoio próximo pode ser o fim.
E é isso que afasta tantos vencedores do Tour da Roubaix: o risco elevado de lesão, especialmente tão perto do verão.
Pogacar conhece esse risco. A queda que lhe fraturou o pulso na Liège 2023 afetou-lhe a preparação para o Tour. A UAE já fez vários reconhecimentos do percurso, mas o esloveno não compete em paralelos há dois anos.
Sim. Pogacar brilhou na etapa de paralelos da Volta a França 2022, e na Volta à Flandres 2023 venceu isolado frente a Van der Poel e Van Aert. Tem explosividade, resistência, técnica — um perfil ideal.
Mas Roubaix não é a Flandres. Pode ter pernas para seguir um ataque no Carrefour… mas também pode furar, cair, ou ser apanhado fora de posição.
Além disso, enfrentará uma dupla fortíssima: Mathieu van der Poel e Jasper Philipsen, 1.º e 2.º em 2023 e 2024. Com o apoio da Alpecin-Deceuninck, são uma ameaça tática consolidada.
E aqui surge a pergunta: será Roubaix suficientemente dura para Pogacar? Ou seja, haverá subidas que o permitam fazer diferenças?
A entrada de Pogacar na Paris-Roubaix é um marco histórico. Um campeão da Volta a França a alinhar em Roubaix é raro. Vencê-la, então, seria entrar numa galeria restrita.
Se triunfar, não só quebra um jejum de mais de quatro décadas como fica a um Monumento (Sanremo) de completar a coleção.
A expetativa é enorme. A presença de Pogacar poderá tornar a edição de 2025 a mais assistida dos últimos anos, cruzando fãs das Grandes Voltas com os adeptos fervorosos das clássicas.
“Estamos a preparar tudo ao mais alto nível”, disse Vierhouten. “Ainda há trabalho a fazer, mas este é um desafio único. É história a acontecer.”
Antes de Roubaix, Pogacar enfrenta a Volta à Flandres, onde tentará travar o campeão em título Van der Poel. Será o último grande teste antes do Inferno do Norte.
Independentemente do resultado, o foco não desaparece. A seguir, Pogacar regressará à Liège-Bastogne-Liège, onde já venceu duas vezes. Em outubro, deverá defender o título na Il Lombardia, procurando um inédito penta.
No fim de 2025, Pogacar poderá ter no currículo, num só ano civil:
Uma combinação de versatilidade, ambição e consistência que não se vê há décadas — se é que alguma vez se viu.
A decisão de correr a Paris-Roubaix não é apenas corajosa — é histórica. Pogacar entra numa linhagem de ciclistas como Merckx e Hinault, que procuraram dominar todas as facetas do ciclismo.
Roubaix é sempre uma aposta. Mas para quem já conquistou tudo, a grandeza está em desafiar o impossível.
Triunfe ou não, o simples facto de alinhar em Roubaix é uma vitória para o desporto. Um sinal de que as maiores estrelas não têm medo de se pôr à prova no palco mais cruel e lendário do ciclismo.
E se vencer? Podemos estar perante o ciclista mais completo da história.