Rafal Majka construiu a sua carreira ao serviço dos maiores nomes do ciclismo moderno. Primeiro ao lado de
Alberto Contador na Saxo Bank, depois como companheiro fiel de
Peter Sagan durante os anos de BORA - Hansgrohe, e mais recentemente como escudeiro de luxo de
Tadej Pogacar na
UAE Team Emirates - XRG, o polaco foi sempre o ciclista em quem as equipas puderam confiar nos momentos mais decisivos.
Agora, às portas da reforma, Majka olha para trás e encontra um fio condutor que une os três campeões que marcaram a sua trajetória. "Todos eles são incrivelmente fortes mentalmente",
explicou em entrevista ao Bici.Pro. "O Alberto era capaz de dizer que ia ganhar o Giro, o Tour ou a Vuelta e depois fazia-o mesmo. O Sagan, quando estava no auge, podia vencer tudo, três Campeonatos do Mundo consecutivos não são normais. E depois há o Tadej, que não fala muito, mas ganha tudo. Pogacar fala menos, mas ganha mais".
Uma carreira definida pela consistência
Num pelotão marcado por mudanças constantes de camisola, a longevidade de Majka destaca-se. Passou seis anos sob a direção de Bjarne Riis e Oleg Tinkov, quatro temporadas na BORA, e os últimos cinco anos na UAE Team Emirates. Cada uma dessas passagens, sublinha o polaco, foi determinada tanto pela confiança conquistada como pelo momento da sua carreira.
"Na Saxo Bank sempre senti confiança e cheguei a ser líder, mas também podia ajudar Contador. Na BORA, tornei-me o único capitão da geral, e isso transformou-se num fardo pesado. Depois de quatro anos senti que precisava de mudar. Então apareceram os Emirates, onde já se falava de um jovem chamado Pogacar. Pensei que ele pudesse ganhar uma ou duas corridas, mas de repente estava ao lado de alguém que vence tudo e que se vai tornar numa lenda. Para mim, foi um privilégio correr com o melhor ciclista do mundo, talvez mesmo o melhor da história. Esta equipa é como uma família, e sei que vou sentir saudades".
Ao longo da sua carreira, Majka somou 16 vitórias profissionais, entre as quais, 3 etapas no Tour e 2 na Vuelta
O papel de domestique como escolha consciente
Majka sempre fez questão de frisar que o seu papel como gregário não foi uma imposição, mas uma escolha pessoal. "Quando cheguei aos 30 anos percebi que era melhor ser um bom domestique do que ganhar apenas uma ou duas corridas por ano. Por isso, aceitei integrar a UAE, sem saber quão forte o Pogacar se iria tornar. Ajudá-lo é um tipo de pressão diferente, temos de estar prontos no momento em que ele pede. Mas esse stress é mais fácil de suportar porque sabemos que ele pode realmente ganhar tudo. É isso que me permitiu prolongar a carreira sem estar esgotado".
Ainda assim, a reforma começa a impor-se. Depois de pódios na Volta à Áustria, de celebrações na sua Polónia natal e do orgulho em orientar jovens talentos como Isaac Del Toro na Toscânia, Majka anunciou que 2025 será a sua última época. "Ainda tenho motivação para pedalar e treinar, mas a decisão veio da minha família. Quero passar tempo com os meus filhos. Estive fora durante 24 anos, oito meses por ano na estrada. Eles têm agora cinco e nove anos, o tempo passa demasiado depressa".
Majka desfrutou de um momento comovente com a família na recente Volta à Polónia
Olhar para a próxima geração
A edição deste ano da Volta a Itália ofereceu uma amostra do futuro da equipa. Isaac Del Toro vestiu a Camisola Rosa até à penúltima etapa antes de ceder, mas Majka não tem dúvidas de que o mexicano está destinado a grandes conquistas. "Manter a camisola rosa até quase ao fim aos 21 anos é algo incrível. Talvez lhe tenha faltado experiência, mas é muito forte. Estou certo de que vai brilhar nos Mundiais e, mais cedo ou mais tarde, vai ganhar uma Grande Volta".
O polaco também deixou uma mensagem especial para Juan Ayuso, que deixará a Emirates no final da época. "O meu conselho para ele é simples: acelerem a fundo. Treinem a 100 por cento e deem tudo. O Ayuso tem o talento necessário para triunfar em qualquer equipa".
Vida além do pelotão
Quanto ao futuro, Majka admite que vai sentir falta da rotina do pelotão. "Se fazemos a mesma coisa desde jovens, é impossível não sentir falta. Mas quero voltar a desfrutar da bicicleta de outra forma: pedalar sem olhar para os watts, aproveitar a natureza, fazer quilómetros com outro espírito".
E será que existe a possibilidade de se tornar diretor desportivo? O polaco prefere não se comprometer. "Perguntem-me daqui a quatro meses", disse entre risos. "Primeiro quero descansar. Depois veremos o que o futuro me reserva, porque não quero cortar os laços com um mundo de que gosto tanto".