Tom Dumoulin foi um dos ciclistas mais talentosos da sua geração, conquistando feitos que a maioria dos profissionais apenas sonha alcançar. No entanto, a crescente profissionalização do ciclismo e a pressão por uma abordagem cada vez mais científica e padronizada acabaram por minar a motivação do neerlandês, levando-o a uma retirada precoce da modalidade.
A sua entrada no pelotão profissional deu-se em 2012, na equipa Argos-Shimano (mais tarde Team Sunweb), onde viveu os anos mais felizes da carreira. “Talvez tenha sido aí que a faísca se acendeu, sim. Nos meus primeiros anos como profissional, parecia um sonho tornado realidade. Lembro-me do meu primeiro Tour com a Argos-Shimano, quando ganhámos quatro etapas com o Marcel Kittel”, recorda Dumoulin em entrevista ao Het Nieuwsblad. “Tinha um papel importante no comboio do sprint e, nas restantes etapas, podia explorar e descobrir os meus próprios limites. Posso dizer agora que foi o período mais agradável da minha carreira".
Mas essa liberdade foi-se esfumando à medida que o ciclismo moderno se tornava cada vez mais centrado em métricas e metodologias rígidas. Quando anunciou a reforma em 2022, Dumoulin sentia-se já esgotado emocionalmente. “Não conseguia continuar. Já não sentia prazer algum. Era apenas um executante. O nutricionista dizia-me o que comer, o treinador onde e como treinar. Ninguém me perguntava como me sentia com isso. Foi aí que me perdi".
O holandês explica que, nos seus primeiros anos, sentia que estava a montar o puzzle da própria carreira com entusiasmo, integrando os conselhos da equipa. Mas nos últimos anos de carreira, diz "deixei de montar o meu próprio puzzle e passei a ser apenas uma peça no de outra pessoa".
Com um currículo que inclui uma vitória na
Volta a Itália, um pódio na
Volta a França e um título mundial de contrarrelógio, Dumoulin era reconhecido como um dos grandes nomes do ciclismo mundial. Ainda assim, a constante busca por ganhos marginais, aliada a uma estrutura cada vez mais rígida, acabou por afastá-lo do prazer de competir.
“Os melhores ciclistas da atualidade são aqueles que conseguem encontrar o equilíbrio. Pogacar e Van der Poel, por exemplo, cresceram em estruturas que sempre valorizaram os seus instintos. O Mathieu continua a ter muita autonomia. Alimenta-se de forma saudável, aproveita os avanços da ciência, mas decide por si próprio em que corridas participa ou não”, elogia.
A abordagem da
Team Visma | Lease a Bike — equipa que representou entre 2020 e 2022 — também não passou despercebida na sua análise. “Eles alcançaram enormes sucessos com a sua obsessão pelos dados e pelo detalhe. Essa fórmula funciona para alguns. Mas o verdadeiro desafio está em equilibrar a ciência com a dimensão humana do treino. E para mim, essa balança deixou de fazer sentido".
Dumoulin representa uma geração que viu o ciclismo mudar radicalmente. E se para alguns essa mudança foi o caminho para o topo, para ele acabou por ser o ponto final.