Hoje foi escrito um dos capítulos mais emotivos da história recente do ciclismo. Um capítulo de redenção, de resiliência e de justiça poética. Na
Volta a Itália 2025,
Simon Yates voltou ao cenário onde, sete anos antes, os seus sonhos tinham sido desfeitos e, desta vez, saiu vencedor.
Em 2018, Simon Yates liderava o Giro quando chegou à brutal subida de gravilha do Colle delle Finestre. Nessa tarde, a Camisola Rosa escapou-lhe por entre os dedos numa das quebras mais dramáticas que o ciclismo moderno testemunhou. Durante anos, o Finestre assombrou-o. Mas hoje, o britânico da
Team Visma | Lease a Bike respondeu com um ataque implacável, transformando a montanha que o condenou na montanha que o consagrou.
O diretor desportivo da Visma, Marc Reef, explicou ao Eurosport que este momento esteve em preparação desde muito antes da primeira pedalada em Itália. "O Simon falava desta etapa desde o inverno passado", revelou. "Todos sabem o que aconteceu em 2018. Ele queria provar algo hoje."
O plano era claro e foi executado com precisão cirúrgica. Wout van Aert foi enviado para a fuga do dia, um movimento estratégico para ter uma peça fundamental mais à frente, pronta para ajudar no momento certo. "Quando a diferença cresceu, sabíamos que o Wout poderia ultrapassar o Finestre. Se o Simon tivesse pernas, podia ser decisivo", detalhou Reef.
No momento crítico, enquanto Richard Carapaz e Isaac del Toro hesitavam e se marcavam mutuamente, Yates atacou. "Eles olhavam demasiado um para o outro", comentou Reef. "O Simon aproveitou e teve pernas para fazer a diferença."
Yates não vacilou. Subiu de forma decidida e, ao encontrar Van Aert já posicionado após o Finestre, consolidou ainda mais a vantagem. "O Wout fez um trabalho fantástico. Sem ele, teria sido muito mais difícil", reconheceu Reef. "Tivemos comunicação constante, controlamos as diferenças e, a três quilómetros do alto, percebemos que o Simon estava no controlo."
Após o alto, a missão foi simples: descer com segurança, manter o foco e deixar os fantasmas do passado alimentarem cada pedalada até à meta. "É difícil expressar isto em poucas palavras", disse Reef sobre a vitória. "É fantástico para a equipa e para o Simon. Nos dias mais explosivos, Carapaz e Del Toro foram superiores, mas no Finestre o Simon mostrou que a sua força mental é única."
Steven Kruijswijk, colega de equipa e ele próprio uma vítima da crueldade do Giro em 2016, emocionou-se ao comentar o feito. "É inacreditável, a história perfeita", afirmou. "O facto de o Simon conquistar a Camisola Rosa precisamente no Finestre é poético. Lutou contra dois rivais fortíssimos e acreditou até ao fim. Precisava de um super dia, e hoje foi esse dia."
Kruijswijk foi filosófico ao recordar o seu próprio passado: "O que aconteceu comigo faz parte da história. No ciclismo pode perder-se tudo num instante, mas também se pode ganhar. E hoje, o Simon provou que a perseverança vale a pena."
Simon Yates fecha assim um ciclo. A subida que outrora representou a maior dor da sua carreira tornou-se o palco da sua redenção. Um triunfo conquistado não apenas com força, mas com inteligência, coragem e uma equipa que, desta vez, esteve à sua altura.