Remco Evenepoel despediu-se da
Volta a França de forma dolorosa, com dias sucessivos de fraqueza física que o afastaram irremediavelmente da luta pela geral. A quebra definitiva surgiu no Col du Tourmalet, símbolo dos Pirenéus, onde Remco acabou por ceder e recolher ao carro da Soudal - Quick-Step. Ainda assim, mostrou-se disponível para os jornalistas e convidou a equipa para um jantar antes de abandonar discretamente a corrida.
Patrick Lefevere, ex-diretor da equipa, foi direto ao diagnosticar os motivos do insucesso. “Remco não teve um inverno em condições. O estágio após o Dauphiné também não correu bem. Precisávamos de um milagre, mas ele não aconteceu”, afirmou ao Het Nieuwsblad. O campeão olímpico viu a sua preparação comprometida por uma violenta queda em dezembro, que lhe causou várias fraturas e o afastou da estrada durante dois meses. Só regressou à competição em abril, após ter reorientado o foco para as Clássicas, onde ainda brilhou.
Mas faltaram-lhe os quilómetros estruturantes de fundo, sobretudo para os grandes esforços de alta montanha. No Critérium du Dauphiné parecia voltar ao nível esperado, mas já durante a segunda semana da Volta a França os sinais de desgaste tornaram-se evidentes. Hautacam, Peyragudes, subidas onde Evenepoel já mostrava dificuldade em manter-se entre os melhores. A 14ª etapa, que passou por Lourdes antes de enfrentar o Tourmalet, confirmou que não haveria redenção.
Ainda assim, houve episódios que mostraram o espírito combativo de Remco. Na etapa 12, depois de ser deixado para trás no início da subida ao Col du Soulor, conseguiu recuperar e aguentar-se surpreendentemente bem. Lefevere destaca esse momento como um símbolo de resiliência: “Foi o que mais me marcou. Ele estava física e mentalmente destroçado, mas lutou. Na etapa de Hautacam todos achavam que ia perder meia hora. Mas resistiu, lutou a sério. Sinceramente, no ano passado não teria conseguido.”
Num gesto simbólico, Evenepoel agradeceu ao staff da equipa com um convite improvável: levou o staff ao McDonald's. Lefevere conta o episódio com um sorriso: “De repente vejo todos o staff a chegar junto. Tinham ido com o Remco ao McDonald's. É verdade. Agora ele pode comer de novo”, disse, numa alusão ao regime rigoroso imposto durante o Tour.
Apesar do desfecho amargo, não houve recriminações internas. Lefevere mostrou respeito pela forma como o seu líder geriu a adversidade. “Remco teve uma atitude muito digna. Não disse uma única palavra negativa sobre os colegas. Quando alguém não está em forma, não vale a pena inventar desculpas. Mas se falar por mim, creio que se podia esperar mais de ciclistas como Maximilian Schachmann ou Valentin Paret-Peintre.”
O Tour terminou para Remco Evenepoel sem glória, mas com humanidade. Falhou a conquista da geral, mas não perdeu a compostura nem o respeito dos que o rodeiam. E por vezes, no ciclismo como na vida, isso também conta.