A tradicional etapa final da
Volta a França nos Campos Elísios vai sofrer uma transformação histórica em 2025: a mítica subida empedrada de Montmartre, cenário dramático da corrida olímpica em Paris 2024, será agora parte do derradeiro dia do Tour. A decisão, aplaudida por muitos adeptos por poder trazer emoção e imprevisibilidade a uma etapa habitualmente processional, está a gerar inquietação entre os ciclistas.
Jonas Vingegaard, vencedor da Volta em 2022 e 2023, não escondeu o seu ceticismo quanto à mudança. “Para ser honesto, não acho que seja uma boa ideia”, afirmou o dinamarquês, recordando o contexto olímpico como muito diferente. “Nos
Jogos Olímpicos, havia apenas 50 ciclistas no final, era controlável. No Tour, serão mais de 150 a lutar por posição numa subida estreita. Vai ser muito mais stressante do que os organizadores imaginam.”
A preocupação de Vingegaard não está isolada.
Remco Evenepoel, campeão olímpico em Montmartre no verão passado, também desaconselha a decisão: “Não compliquem demasiado. A ronda local habitual nos Campos Elísios já é suficiente. Depois de três semanas, todos estão exaustos. Ter de lutar por posição numa subida empedrada no último dia não é o que o pelotão precisa.”
Emoção ou risco desnecessário?
A crítica principal está centrada na segurança e na dinâmica de corrida. A subida de Montmartre é técnica, estreita e com paralelos irregulares. Num cenário com um pelotão ainda massivo e com alguns sprinters a tentar conquistar a camisola verde ou a etapa, o risco de quedas e confusões é elevado.
A organização ainda não revelou os detalhes completos do novo percurso, que será apresentado oficialmente a 21 de maio, mas a simples confirmação da inclusão de Montmartre já fez soar alarmes entre os líderes de GC e diretores desportivos. Muitos lembram que a última etapa serve historicamente para consagrar os vencedores e permitir uma entrada simbólica em Paris, sem os perigos habituais das etapas anteriores.
O dilema: espetáculo versus tradição
Por um lado, a proposta de transformar a última etapa em algo mais do que uma formalidade agrada a fãs e comentadores. Montmartre pode dar uma oportunidade aos clássicos e baralhar o guião previsível de sprint final nos Campos Elísios. Por outro lado, para um pelotão exausto e marcado por três semanas de guerra, a ideia de uma última batalha em paralelo e com curvas apertadas parece, para alguns, um exagero.
Como sintetizou um ciclista veterano ao L'Équipe, em anonimato: “Depois de três semanas de batalha, ninguém quer correr riscos a 70 km/h numa rampa com paralelos. Mas se houver camisolas em jogo, vai haver luta.”
O debate está lançado. A organização quer emoção, os ciclistas querem segurança. Montmartre pode muito bem tornar-se o novo símbolo da tensão entre o espetáculo e o risco no ciclismo moderno