Antes mesmo de se darem as primeiras pedaladas no
Campeonato do Mundo de Estrada da UCI, em Kigali, as atenções desviaram-se abruptamente do ciclismo para um caso de alegada censura. Stijn Vercruysse, experiente correspondente da VRT NWS em África, foi impedido de embarcar para o Ruanda apesar de possuir acreditação completa da UCI e autorização oficial do Ministério do Desporto ruandês.
Vercruysse, que viajava com a delegação belga, onde estava o campeão mundial de contrarrelógio
Remco Evenepoel, foi bloqueado logo no balcão de check-in. “O governo ruandês proibiu a companhia aérea de me deixar embarcar no voo”, confirmou o jornalista. “Isso diz muito sobre a natureza autoritária do regime.” O episódio surge na sequência de reportagens críticas que o belga já havia feito sobre o ambiente político no país africano.
Um Mundial histórico sob uma sombra
Estes Campeonatos do Mundo são históricos: é a primeira vez que o maior evento de ciclismo de estrada se realiza em solo africano. A escolha de Kigali foi vista como uma oportunidade para globalizar a modalidade, reforçar a paixão local pelo ciclismo e abrir novas portas além dos tradicionais centros europeus.
Mas alguns críticos alertaram desde cedo para os riscos de associar o evento a um governo acusado de restringir a liberdade de imprensa e de reprimir a dissidência política. O regime do Presidente Paul Kagame tem sido alvo de escrutínio internacional e a exclusão de Vercruysse parece confirmar alguns desses receios.
Cobertura limitada e reacções diplomáticas
A VRT pretendia relatar não apenas as corridas, mas também o contexto político e social em redor do Mundial, com reportagens “matizadas e críticas”, segundo o próprio jornalista. Com a sua exclusão, essa cobertura ficará severamente reduzida. Curiosamente, outros elementos da comunicação social belga, como as equipas do Sporza e colegas da VRT, viajaram sem qualquer obstáculo, reforçando a percepção de que foi tomada uma medida selectiva.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros belga já contactou as autoridades ruandesas para obter explicações, mas até agora não foi dada qualquer justificação oficial. O ministro Maxime Prévot recordou que ao acolher um evento de dimensão planetária, o Ruanda tem a responsabilidade de respeitar princípios básicos de abertura e liberdade de imprensa. “Não se trata apenas de uma corrida”, sublinhou um representante belga. “É o Campeonato do Mundo. E o mundo está a ver o que se passa.”