Mads Pedersen lamenta que a geração atual do ciclismo tenha herdado a reputação de dopados: "O mal está feito"

Ciclismo
quarta-feira, 16 julho 2025 a 8:00
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Ausente da Volta a França de 2025, Mads Pedersen pode estar longe da ribalta mediática das estradas francesas, mas não se mantém em silêncio. O campeão mundial de 2019 é figura central do novo documentário Shadows of the Past, um retrato pessoal sobre os fantasmas do doping que ainda pairam sobre o pelotão moderno e sobre a frustração de quem, como ele, sente que continua a ser julgado por erros que não cometeu.

“É injusto. E magoa-me.”

Pedersen não esconde o desconforto. “A minha opinião sobre o que aconteceu na altura é que foi absolutamente errado. Mas o que mais me irrita é o facto de estarmos a pagar a fatura”, afirma, referindo-se diretamente à herança envenenada da era Lance Armstrong e do ciclismo dos anos 2000.
O dinamarquês diz-se magoado quando vê o seu esforço posto em causa por quem ainda desconfia dos resultados atuais: “Cheguei aqui devido a um trabalho realmente árduo, e magoa-me a mim e ao meu orgulho quando alguém questiona isso.”

136 dias sem deslizes

O comprometimento de Pedersen com a sua profissão está bem documentado. Após a Paris-Roubaix deste ano, iniciou um regime rigoroso de controlo alimentar. 136 dias consecutivos a registar cada grama ingerida, com exceção da água. “Dedico muitas horas a isto. Dedico muito tempo a isso”, afirma. “Sem me colocar no topo, sou um dos dez no mundo que treina mais e mais duro.”
Mas mesmo essa disciplina é, por vezes, colocada em causa. “É muito sensível para nós, que estamos no ativo, compararmo-nos com essa época. Muita coisa aconteceu no ciclismo desde então”, lamenta. “Não quero defender-me. Só quero dar uma imagem melhor do que fazemos, e depois os antigos podem dar uma imagem do que fizeram.”

Vingegaard, serenidade vs emoção

Apesar de partilharem nacionalidade, a forma como Jonas Vingegaard e Mads Pedersen lidam com as suspeitas públicas não podia ser mais distinta. “O Jonas fá-lo de uma forma super profissional, enquanto eu tenho mais as emoções à flor da pele.”, confessa Pedersen. “Quando ele diz que está tudo bem e você pergunta, a minha reação é: ‘Porque é que está a perguntar? Acho que é ridículo.’”
Esta diferença de posturas reflete também o lugar que cada um ocupa no pelotão: Vingegaard, ex-vencedor da Volta a França, é alvo constante de escrutínio, mas mantém um estilo reservado. Pedersen, mais impulsivo, assume uma relação mais direta com o público e, por vezes, mais explosiva.

Sem soluções fáceis, apenas franqueza

Questionado sobre como alterar a perceção do grande público, Pedersen admite não saber a resposta. “Não sei fazer isto da melhor maneira possível nem dar a melhor resposta possível. Para mim, é apenas uma reação natural quando sou questionado em algo em que me sinto injustiçado.”
Essa frustração não vem de um sentimento de vitimização, mas de uma tentativa sincera de defender o mérito individual. “Sinto-me mesmo numa situação dessas porque o meu trabalho árduo está a ser negligenciado.”

“O mal está feito”

A frase final de Pedersen no documentário é tão amarga quanto honesta: “O mal está feito. E por isso estamos todos a tentar remedia-lo a partir daqui.” É o reconhecimento de que as sombras do passado continuam a pairar sobre o pelotão moderno, mesmo duas décadas depois dos grandes escândalos de EPO e transfusões.
Mas é também um apelo: por justiça, por reconhecimento do esforço limpo e legítimo dos ciclistas atuais, e por uma nova geração que quer deixar o seu legado sem precisar de o justificar a cada passo.
Neste Tour em que o próprio Pedersen não está a competir, a sua voz acaba por ecoar como uma das mais humanas e corajosas de todo o pelotão.
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