O presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo (FPC),
Candido Barbosa, está a ser alvo de averiguações,
confirmou a Procuradoria-Geral da República ao Expresso. Em causa estará a contratação, por parte da federação, de uma empresa que o antigo ciclista, hoje com 50 anos, terá detido no passado, segundo apurou o jornal junto de fonte próxima do processo que envolve o dirigente máximo da modalidade.
A denúncia apresentada deu igualmente entrada no Comité Olímpico de Portugal (COP). O organismo olímpico confirmou o recebimento da queixa e esclareceu, por fonte oficial, que "não tem quaisquer competências de fiscalização e auditoria sobre as federações desportivas". "Ainda assim, dado o teor da mesma, reencaminhou-a para o Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ)", acrescentou o COP.
O inquérito terá origem numa participação que levanta suspeitas sobre uma eventual venda fictícia da empresa StrongSpeed, especializada na montagem de infraestruturas para provas desportivas, como barreiras de proteção, pódios e outros equipamentos logísticos. A empresa foi criada por Cândido Barbosa em 2018, mantendo-se sob a sua gerência até 17 de novembro de 2024, data situada entre a vitória nas eleições para a presidência da FPC e a respetiva tomada de posse.
O primeiro ano de Cãndido Barbosa foi algo turbulento, com destaque para o conflito com a antiga organizadora da Volta a Portugal, a Podium Events
Após esse momento, a gerência da StrongSpeed passou para Soraia Pinto, que, segundo informação prestada pela própria federação, "vive, mas não é casada" com o presidente da FPC, mantendo-se então a sede da empresa na Rua Cândido Barbosa, em Paredes. A 31 de janeiro deste ano, Soraia Pinto deixou o cargo, passando a gestão para Rogério Freitas, antigo colaborador de Cândido Barbosa, de acordo com fontes conhecedoras do processo. Atualmente, a sede da empresa situa-se em Oliveira de Frades, no distrito de Viseu.
Estas sucessivas alterações na estrutura societária da StrongSpeed, bem como a alegada manutenção de influência por parte de Cândido Barbosa, estão no centro da investigação. Ao longo da época de 2025, a empresa terá sido contratada para assegurar serviços em vários eventos organizados pela Federação Portuguesa de Ciclismo.
Além da investigação conduzida pela PGR, a situação motivou igualmente uma participação junto do Comité Olímpico de Portugal, posteriormente encaminhada para o IPDJ.
Questionada em março pelo Expresso sobre estas suspeitas, a FPC assegurou que "o presidente da FPC não tem qualquer influência ou ascendente sobre a StrongSpeed". Por seu lado, Cândido Barbosa afirmou estar a ser alvo de uma "perseguição" motivada por "vingança e azedume", garantindo ter a "consciência tranquila". Nove meses antes, o antigo ciclista já tinha defendido que o objetivo das acusações passava por "arrasar o nome de Cândido Barbosa na praça pública", sublinhando ainda que não tinha "a obrigação de dissolver a empresa" e que "nunca disse que o faria".
De referência do pelotão a líder federativo
Figura marcante do ciclismo português no final do século XX e início do atual,
Cândido Barbosa sucedeu a Delmino Pereira na presidência da FPC, após o anterior dirigente ter cumprido o limite máximo de mandatos, ao fim de 12 anos no cargo.
Com mais de uma centena de vitórias enquanto profissional, o conhecido "foguete da Rebordosa" foi por duas vezes segundo classificado na Volta a Portugal e venceu 25 etapas na prova, um registo inédito que o tornou num dos corredores mais populares junto do público.
Depois de pendurar a bicicleta em 2010, dividiu-se entre várias atividades, passando pela política autárquica, como vereador do desporto na Câmara Municipal de Paredes, e pelo setor empresarial, com destaque para a StrongSpeed.
Em 2024, venceu as eleições para liderar a federação fundada em 1899, inicialmente designada União Velocipédica Portuguesa, a mais antiga federação desportiva nacional ainda em atividade, com 18 281 atletas federados.
A FPC tutela a modalidade que, neste século, garantiu três medalhas olímpicas para Portugal: as pratas de Sérgio Paulinho, em Atenas 2004, e de Iúri Leitão, no Omnium, em Paris 2024, além do ouro conquistado por Leitão e Rui Oliveira no Madison, também em Paris. O ciclismo é, a par do atletismo, a única modalidade nacional com um título olímpico.
Os estatutos da Federação Portuguesa de Ciclismo determinam, no artigo 25.º, que os titulares de órgãos federativos que, "no exercício das suas funções, ou por causa delas", intervenham "em contrato no qual tenham interesse", seja como "gestor de negócios ou representante de outra pessoa", incorrem na perda de mandato. A norma estende-se a situações em que o interesse envolva "o seu cônjuge", familiares ou pessoas que "vivam em economia comum". Ainda assim, Cândido Barbosa sustenta que "não existe qualquer fundamento para a perda de mandato".