Nos dias seguintes à sua derrota na Volta a França Feminina de 2025, Demi Vollering fez manchetes não só por ter terminado em segundo lugar, mas pelo tom que adotou ao abordar o escrutínio mediático em torno do seu peso. Num longo post no Instagram, a ex-campeã do Tour procurou reenquadrar a discussão, priorizando a saúde em vez dos quilos, e recuando contra o que ela caracterizou como uma fixação doentia no peso corporal no desporto de elite.
Mas o antigo vencedor da Volta a Espanha, agora analista de ciclismo, Chris Horner não está convencido. Numa edição caracteristicamente direta da sua análise no canal YouTube, Horner dissecou o desempenho de Vollering na etapa 9, a última etapa de montanha da corrida, e discordou do que considerou ser uma desconexão entre a narrativa pós-corrida de Vollering e as realidades táticas e fisiológicas do ciclismo de elite.
"Somos ciclistas profissionais. O peso vai ser sempre um fator", disse Horner. "Se não tiveres watts por quilo melhores do que o ciclista ao teu lado, então é melhor teres táticas melhores. Caso contrário, as hipóteses de ganhar são nulas."
Mensagem de Vollering após o Tour
A publicação de Vollering nas redes sociais, partilhada vários dias após a conclusão do Tour feminino, ofereceu uma reflexão sincera e ponderada sobre as pressões enfrentadas pelas atletas femininas. Nele, Vollering reconheceu o volume de atenção dos meios de comunicação social após a corrida em relação ao seu peso corporal e deixou claro que, para ela, a prioridade seria sempre a saúde a longo prazo em detrimento dos ganhos de desempenho a curto prazo.
"Não fui feita para ser a ciclista mais leve do pelotão. E não quero forçar o meu corpo a tornar-se algo que não é", escreveu. "Fizemos tudo o que podíamos para chegar ao Tour na melhor forma possível - para mim... Perder peso não é a solução."
Também chamou a atenção para a influência dos atletas de elite nas gerações mais jovens: "Porque as raparigas jovens estão a observar-nos. Elas reparam no que dizemos, e no que não dizemos... O risco é real... o pensamento desordenado pode crescer silenciosamente e permanecer escondido durante muito tempo."
O post foi amplamente elogiado por todo o desporto pela sua maturidade e franqueza, especialmente tendo em conta o delicado equilíbrio que as atletas femininas têm frequentemente de encontrar entre desempenho, saúde e expectativa pública. Mas Horner, apesar de não ter ignorado o sentimento, considerou-o desfasado dos erros táticos que, na sua opinião, definiram a corrida de Vollering. E a sua incapacidade de igualar a eventual vencedora Pauline Ferrand-Prévot em termos de desempenho físico bruto.
Vollering ficou num distante 2º lugar, atrás de Ferrand-Prevot, em França
"Foste 0 a 2": A crítica de Horner
A maior parte das críticas de Horner centraram-se na Etapa 9, um percurso brutal de 125 quilómetros com três subidas classificadas e uma subida íngreme até à meta. A equipa FDJ-Suez de Vollering pedalou agressivamente, com Juliette Labous e Evita Muzic a marcarem o ritmo durante grande parte do dia, enquanto Ferrand-Prévot permaneceu isolada com a camisola amarela.
No entanto, apesar desta aparente vantagem numérica, Horner argumenta que as táticas da FDJ entregaram efetivamente a corrida a Ferrand-Prévot. "Tiveram a camisola amarela isolada durante 80% da etapa e ninguém aproveitou", disse Horner. "A Demi Vollering puxou por ela até à meta."
Horner foi particularmente mordaz quanto à oportunidade perdida de forçar Ferrand-Prévot a ir para a frente, ou de a isolar sob pressão lançando ataques repetidos. "Se a Demi Vollering não está no seu nível ótimo de watts por quilo, não se pode ir um contra um contra Ferrand-Prévot", disse ele. "Fazê-la cobrir os ataques. Mas o que é que aconteceu? Ela ficou ali sentada como se estivesse a comer um Snickers de coco, a receber uma boleia grátis."
O debate sobre peso, desempenho e responsabilidade
Horner reconheceu a complexidade da questão do peso no ciclismo profissional, mas não escondeu a sua importância: "Sim, a forma como se chega ao peso de corrida é importante. A saúde é importante. Mas não vamos fingir que não é um fator de desempenho. E é."
Contou a sua própria experiência como ciclista da FDJ no final dos anos 90, descrevendo a forma como o seu diretor desportivo conseguia detetar um ganho de meio quilo, apesar dos casacos de inverno e das camadas de roupa.
Ainda assim, a mensagem de Vollering ressoa num desporto em que as histórias de alimentação desordenada, sub-alimentação e consequências a longo prazo para a saúde têm vindo a ser cada vez mais reveladas, particularmente no pelotão feminino. Enquanto a análise de Horner se centra nas deficiências táticas e fisiológicas, o post de Vollering pretende alargar a conversa para incluir o bem-estar dos atletas e a mensagem enviada às gerações futuras.
Em última análise, o debate resume-se ao equilíbrio entre realismo e responsabilidade. Vollering insiste que não existe um caminho único para o sucesso neste desporto. Horner, por sua vez, vê a etapa 9 como um caso exemplar de uma ciclista que perdeu porque não conseguiu acertar em nenhum dos dois elementos mais críticos: potência/peso e tática.
Ambos os pontos de vista podem ser verdadeiros. O que é claro é que as palavras de Vollering, e a resposta de Horner, desencadearam uma conversa que vai muito para além de uma única etapa ou de um único Tour.