A etapa de abertura da Volta a França 2025 foi um verdadeiro teste de sobrevivência. Para Geraint Thomas, o corredor mais experiente do pelotão e que disputa neste Tour a última Grande Volta da carreira, o arranque da corrida foi tudo menos cerimonial.
Aos 39 anos, o britânico da INEOS Grenadiers enfrentou uma jornada caótica, marcada por quedas, cortes no pelotão e decisões táticas de alto risco. Num registo sincero partilhado no seu podcast, Thomas refletiu sobre a dureza do dia e o simbolismo pessoal da sua despedida:
“Vi algumas coisas aleatórias nas redes sociais, pessoas a dizer que eu era o mais novo no meu primeiro Tour e agora sou o mais velho no meu último. É um ciclo completo, não é? Tem havido muita conversa sobre se estou a ficar emocionado ou a tentar aproveitar. Obviamente que queremos desfrutar, mas dias como o de hoje só se apreciam depois de terminarem e de termos sobrevivido. Tenho a certeza de que virão etapas mais agradáveis, mas hoje foi uma etapa típica do Tour.”
A jornada ficou marcada por uma queda a meio da etapa, que forçou o abandono prematuro de Filippo Ganna, uma das peças-chave da equipa. Thomas descreveu o momento com pesar: “Foi numa curva à direita, nem era uma curva a sério. Vi o Ganna no chão, sentado, com uma careta, mas achei que estivesse be. Não íamos assim tão depressa. Depois, ele demorou imenso a regressar ao pelotão, o que me pareceu estranho. A certa altura ouvimos no rádio que o médico o tinha parado por suspeita de concussão. Foi a decisão correta, claro. Mas é um golpe duro. O Ganna era uma das nossas cartas mais fortes para os contrarrelógios e para as fugas.”
Apesar de não ter estado envolvido na queda, Thomas viria a perder 39 segundos para os principais candidatos à geral, ao ser apanhado atrás de uma cisão provocada nos quilómetros finais. Sem esconder o desânimo, o veterano reconheceu um erro de posicionamento: “Sabia que a separação ia acontecer. Estava talvez sete ou oito posições atrás. Quando entrou a curva, pensei: ‘Tenho de me mexer, mas isto vai doer’. Vi três da Trek na frente, um deles era o Milan, o sprinter, por isso achei que iam controlar. A Quick-Step e o Remco estavam atrás de mim, o Roglic também por perto. Tornei-me preguiçoso. Sentei-me na roda. Fui complacente. Pensei que iam fechar o espaço, mas hesitaram. Depois o fosso abriu-se. Passei os últimos 15 quilómetros a amaldiçoar-me.”
Thomas insiste que não entrou na corrida com ambições claras para a classificação geral, mas a frustração foi visível: “Nem sequer era suposto eu estar a pensar na CG, mas mesmo assim irrita-me. Sabes que vai acontecer, mas acabas por cometer o erro na mesma.”
Apesar do contratempo, o ambiente dentro da equipa manteve-se relativamente leve. Thomas partilhou um momento de humor com Jonas Vingegaard no final do dia: “Estive à conversa com o Jonas durante uns 45 minutos. Ele brincou: ‘Estás com saudades? Estás contente por estares de volta?’ E eu disse-lhe: ‘Amigo, devia ter parado no ano passado, isto é mesmo stressante’. Foi um momento engraçado.”
A estratégia da INEOS para esta edição passava por deixar de lado a habitual tentativa de alinhar com equipas rivais e procurar um estilo mais fluido, mas o caos da etapa levou a decisões diferentes: “Tínhamos dito que não iríamos alinhar com outras equipas este ano, mas foi tudo tão caótico que acabámos por o fazer, só para tentar manter a posição do Carlos (Rodriguez). Os da frente iam no limite e, atrás deles, eu e o Jonas conversávamos um pouco. Toda a gente diz o mesmo: ‘Isto é uma loucura, não é? Mas estamos todos a fazê-lo’.”
Com Filippo Ganna fora de prova e uma pequena desvantagem logo no primeiro dia, Thomas inicia a última Volta a França da sua carreira com uma mistura de nostalgia, frustração e resiliência, traços que sempre marcaram o seu percurso no ciclismo profissional.