A relação entre a Federação Portuguesa de Ciclismo (FPC) e a Podium Events chegou ao fim de forma abrupta e polémica. Em resposta ao
comunicado federativo que anunciou “com efeitos imediatos” o término do contrato de concessão da
Volta a Portugal, a empresa organizadora divulgou um extenso esclarecimento público onde contesta a decisão e acusa a FPC de falta de transparência, decoro e lealdade institucional.
A reação da Podium
Logo no primeiro ponto do comunicado, a Podium afirma ter sabido da rescisão “através de alguns dos nossos patrocinadores”, que terão sido contactados pela FPC “provavelmente já com intuitos comerciais”. Para a empresa, o modo como o processo foi conduzido “mostra falta de decoro e lealdade por parte da Federação”.
A Podium lamenta ainda “profundamente esta postura”, sublinhando que a decisão federativa ocorreu “na pendência de negociações relativas à regulação de questões financeiras do contrato”, e considera “infundada” a invocação de incumprimento contratual.
O histórico da parceria
A empresa recorda que organiza a Volta a Portugal desde 2001 e que, desde então, tem alertado a FPC para os “impactos profundos e irreversíveis” provocados pela pandemia de Covid-19 e pelos escândalos de doping que abalaram o ciclismo português. Esses fatores, sustenta, “alteraram de forma substancial e permanente a matriz de equilíbrio e proporcionalidade do contrato”.
Segundo o comunicado, a Podium terá solicitado “por diversas vezes e de forma construtiva” a revisão equitativa do acordo, com o objetivo de garantir “condições justas e razoáveis para ambas as partes”. No entanto, acusa a Federação de se manter “indisponível para um diálogo construtivo”, ignorando repetidamente esses pedidos.
As críticas à Federação
A empresa aponta diretamente falhas à FPC no combate ao doping, referindo “a incapacidade demonstrada em prevenir e mitigar os gravíssimos problemas” que afetaram a modalidade. Cita, entre outros, os casos de Délio Fernández, Venceslau Fernandes e António Carvalho, bem como as “graves alegações” de José Azevedo no final da última edição da Volta.
Além disso, a Podium alega ter suportado “responsabilidades e encargos substancialmente superiores aos fixados no contrato”, assumindo custos adicionais em benefício do ciclismo português e da própria Federação. A empresa defende que os atuais procedimentos de execução contratual permanecem “alinhados com as práticas observadas em exercícios anteriores”, sendo apenas necessária uma “revisão equilibrada” que restabeleça a proporcionalidade entre obrigações e contrapartidas.
Falta de diálogo e acusações de dívida
Num tom crítico, a Podium afirma ter solicitado várias reuniões ao presidente e à direção da FPC “para verificação, conciliação e determinação transparente dos saldos e responsabilidades financeiras entre as partes”, encontros que a Federação “recusou sistematicamente realizar”.
A empresa rejeita ainda a alegada dívida que lhe foi imputada, considerando que “carece de base factual adequada e de validação conjunta”. Por essa razão, a Podium “não reconhece qualquer fundamento jurídico ou contratual” que legitime a rescisão e reafirma “a plena vigência e exigibilidade do contrato”. A organização adianta que recorrerá “a todos os meios ao seu dispor” para defender os seus direitos e interesses.
O futuro incerto da Volta
No fecho do comunicado, a Podium lamenta “profundamente a tomada de posição” da Federação, frisando que o seu trabalho “foi ao longo dos anos refreado pela própria FPC em questões de valorização desportiva”. Apesar da rutura, a empresa garante manter “o compromisso com o ciclismo português” e promete continuar a trabalhar “com a mesma dedicação e integridade de sempre, em colaboração com todos aqueles que partilham este propósito e que, tal como nós, estejam por bem”.
A separação entre a Podium Events e a Federação Portuguesa de Ciclismo deixa em aberto o futuro imediato da Volta a Portugal, prova rainha do calendário nacional. A FPC já anunciou que apresentará “um novo modelo de organização” para 2026, enquanto a Podium prepara uma defesa jurídica da sua posição. Entre acusações de falta de diálogo, divergências financeiras e críticas à gestão da modalidade, o ciclismo português enfrenta agora um dos períodos mais tensos da sua história recente.
Foto: Nuno Veiga/Lusa