As grandes equipas do pelotão internacional continuam numa autêntica corrida ao ouro para encontrar o próximo Remco Evenepoel ou Tadej Pogacar. Mas, para Cole Kessler, há riscos em acelerar demasiado o processo. O jovem norte-americano, que competiu nas duas últimas épocas pela
Lidl-Trek Future Racing, acredita que o ciclismo está a perder noções fundamentais de progressão e maturação física.
O campeão norte-americano de contrarrelógio sub-23 terminou a sua etapa de desenvolvimento em 2025 e prepara-se agora para um novo desafio em 2026, com uma transferência muito comentada para a recém-criada Modern Adventure Pro Cycling, uma nova equipa ProTeam dos Estados Unidos. Forte, combativo e com uma potência reconhecida, Kessler pretende seguir o exemplo de
Quinn Simmons e tornar-se uma ameaça constante a partir das fugas.
“Sou um ciclista de fugas, sem dúvida. Hoje em dia, para ganhar a partir de uma fuga, é preciso ser muito robusto”, explicou no podcast
The Domestique Hotseat. “É preciso ultrapassar algumas subidas. No Tour, por exemplo, quando a fuga tem hipótese de chegar, é quase sempre em etapas de montanha.”
A inspiração de Quinn Simmons
Entre os exemplos que mais o influenciaram, Kessler destaca o compatriota Quinn Simmons, cuja capacidade de resistência lhe permitiu brilhar em provas duras sem o perfil de um trepador puro. “É um exemplo espantoso de um ciclista que não tem o peso de um trepador, mas que, com a sua robustez, consegue aguentar-se em percursos duros”, recordou, elogiando o quarto lugar de Simmons a partir da fuga na Il Lombardia de 2025.
Durante o seu tempo na Lidl-Trek, Kessler partilhou o pelotão com figuras experientes, entre as quais o belga Tim Declercq, conhecido como “El Tractor”. “Sempre admirei o Tim”, contou. “Quando ele chegou à equipa, foi incrível conversar com ele nos estágios e perceber como pensa. Acho fantástico estar na frente o dia todo e fazer com que o pelotão sofra. É muito divertido.”
Quinn Simmons na Il Lombardia 2025
“A morte da fuga deve-se à UAE Team Emirates”
Kessler também refletiu sobre a forma como o ciclismo moderno tem limitado as fugas, tradicionalmente uma parte essencial da modalidade. “A morte das fugas devem-se, provavelmente, sobretudo à UAE Team Emirates e à forma como correm”, afirmou. “Para o Pogacar ser bem sucedido, precisa que a corrida ande rápida o dia todo.”
Ainda assim, o americano acredita que o espírito das fugas continua vivo. “Não acho que tenha desaparecido por completo. É por isso que se vêem tantos ciclistas a lutar por uma fuga no Tour, com números de potência altíssimos logo na primeira hora. Todos querem ir para a frente.”
“Ninguém devia saltar dos juniores para o World Tour”
Remco Evenepoel e Quinn Simmons são os exemplos mais mediáticos de ciclistas que subiram diretamente dos juniores para o WorldTour, mas nem todos resistem à transição. Simmons, por exemplo, admitiu no passado que teria beneficiado de um período mais longo na categoria de sub-23 antes de entrar no pelotão profissional.
Casos recentes como os de Paul Seixas e Albert Philipsen mostram que a aposta pode resultar, mas Kessler defende uma abordagem mais paciente. “Na verdade, ninguém deveria ir diretamente dos juniores para o World Tour”, sublinhou. “Não se vêem muitos atletas a saírem do liceu e a entrarem diretamente nas ligas principais. É o mesmo no ciclismo.”
Para o jovem norte-americano, o entusiasmo em descobrir o próximo fenómeno não deve sobrepor-se à lógica do desenvolvimento. “Toda a gente quer o próximo Remco, o próximo Pogacar. Estão a contratar miúdos de 15, 16, 17 e 18 anos para equipas do World Tour e esquecem-se de que o ciclismo é um desporto de resistência, e que se melhora com o tempo. Se tiveres 18 anos e fores muito bom, tem calma. Faz dois anos de sub-23 antes de dar o salto”, aconselhou.