No universo do ciclismo, onde tradição e modernidade se cruzam em cada curva, poucas figuras simbolizam tanto o apego ao passado como
Marc Madiot. O antigo diretor desportivo da Groupama-FDJ, conhecido pelo seu fervor pelas clássicas e por um discurso direto, não esconde o ceticismo perante algumas tendências modernas. No entanto, mesmo vindo de alguém que representa a velha guarda, há palavras de apreço para o atual campeão do mundo,
Tadej Pogacar.
Às vésperas da
Paris-Roubaix 2025, Madiot partilhou com o Cyclism'Actu as suas impressões sobre o que poderá ser uma edição memorável da clássica mais brutal do calendário:
“Em teoria, temos todos os ingredientes para uma corrida lendária, daquelas que ficam na história. Mas é preciso ter cuidado com o papel... às vezes tudo acaba numa confusão. Ter bons ingredientes não garante uma boa colheita”.
O antigo responsável da Groupama-FDJ reconhece que os nomes na linha de partida – Pogacar, Van der Poel, Van Aert, Pedersen, Ganna – tornam esta edição particularmente entusiasmante, mas lembra que tudo depende da forma como a corrida se desenrolar:
“São os ciclistas que escrevem a história, e temos de os deixar escrever”.
A sua equipa terá em Stefan Küng um dos nomes a ter em conta, mas Madiot admite que o favoritismo recai noutros. Ainda assim, sublinha a importância da abordagem de Pogacar à corrida:
“Não, isto não se resume a Pogacar e Van der Poel. Há muitos outros com nível semelhante. Mas o entusiasmo aumenta com a presença do Pogacar, e isso deixa-me tranquilo quanto à mentalidade de alguns ciclistas”.
Mais do que os resultados, o francês destaca a atitude do esloveno:
“Já não se trata só de cálculo, mas sim de prazer e desejo. Não sou um apoiante incondicional do Pogacar, mas a sua abordagem a Paris-Roubaix é saudável. Ele devolve protagonismo à mentalidade do ciclista, e isso é positivo".
Questionado sobre o impacto que Pogacar tem tido fora das Grandes Voltas, Madiot não poupa elogios à sua ambição e independência:
“Tenho respeito por ele, mas não sou fã. É como com a música: sou mais Rolling Stones do que Beatles, é uma questão de gosto. Mas admiro que ele diga ‘quero experimentar a Flandres e Roubaix’. Mesmo que os patrocinadores prefiram vê-lo só na Volta à França, ele responde ‘desculpem, mas quem pedala sou eu’”.
Contudo, Madiot deixa um último aviso: por muito forte que um ciclista seja, há um detalhe que pode deitar tudo a perder em Roubaix:
“Se queres ganhar aqui, tens de estar concentrado, cabeça fria, e sobretudo proteger a tua bicicleta. Ninguém fala disso, mas é o mais importante. Podes ser o melhor do mundo, chamar-te Pogacar ou Van der Poel, mas se não cuidares da tua bicicleta, estás fora”.
É o Inferno do Norte – onde até as lendas precisam de respeitar os paralelos.