“Não me fazia feliz apenas ir na roda” – Wout van Aert admite dificuldades mentais para lidar com os efeitos persistentes das quedas de 2024

Ciclismo
quinta-feira, 04 dezembro 2025 a 1:00
Wout van Aert
Wout van Aert entra no inverno com uma noção mais nítida de quem é enquanto corredor, mas chegar aí demorou mais tempo e doeu mais do que muitos perceberam.
Falando abertamente ao Het Nieuwsblad depois de aquele que descreve como um dos anos mais duros da carreira, o belga de 31 anos refletiu sobre o impacto mental da brutal época de 2024 e como a abordagem mais discreta e avessa ao risco no início deste ano quase lhe roubou a alegria que antes tomava como garantida.
Pode ter terminado 2025 com duas vitórias para a memória - o triunfo explosivo no sterrato rumo a Siena e, claro, deixar Tadej Pogacar para trás em Montmartre - mas o caminho até lá foi confuso, frágil e cheio de momentos em que o ciclismo pareceu mais esgotante do que gratificante.
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Wout van Aert derrotou Tadej Pogacar na "nova" chegada da Volta a França.

Uma primavera a travar instintos

Van Aert não fugiu à verdade desconfortável: as cicatrizes de 2024 seguiram-no para 2025 de forma bem mais teimosa do que esperava.
Por vezes na primavera, disse que se apanhou entre o alívio por evitar o perigo e a frustração por não conseguir comprometer-se totalmente. “Nessa altura não me atrevia a atirar-me, e andava a equilibrar-me entre estar contente por não ter caído e frustrado por não estar colocado”, revelou.
Percebeu depressa que o estilo demasiado cauteloso em que escorregou não tinha nada a ver com quem é. “Percebi que não me fazia feliz simplesmente ir ali a rolar”.
Não era apenas uma questão de forma ou condição. Admitiu abertamente que os problemas de posicionamento, evidentes em algumas das maiores Clássicas, foram ampliados pela hesitação, não só pelas pernas.
Onde o Van Aert de outros anos mergulhava instintivamente nas abertas, este ano travou muitas vezes. Aceitar essa mudança foi um passo complicado, mas necessário. “Talvez tenha feito disto um bicho de sete cabeças, porque reparei que estava bem colocado quando não pensava nisso”, disse.

Depois do Tour, clareza

O verdadeiro reset só chegou quando a Volta a França ficou para trás. Van Aert escolheu um outono mais tranquilo, mas não encontrou satisfação, um lembrete do seu ADN competitivo. “Fiz meia dúzia de corridas sem pressão para render e, por isso, não atingi o meu melhor nível e limitei-me a estar lá. Visto agora, teria sido melhor saltá-las, porque não as desfrutei”, admitiu.
Esse período cristalizou o que hoje vê como essencial: precisa de correr no limite, não apenas participar. “Agora sei muito claramente que competir, para mim, é atingir o meu nível mais alto e dar tudo”.

Dwars door Vlaanderen: um momento que feriu mais do que parecia

Um dos pontos de tensão mais públicos do ano foi na Dwars door Vlaanderen, onde a Visma desperdiçou uma superioridade de três contra um frente ao norte-americano Neilson Powless. Os holofotes apontaram rapidamente a Van Aert, que optou por sprintar ele próprio em vez de lançar um colega, decisão de que se arrependeu de imediato.
“Fiquei extremamente desapontado comigo, porque quando decidi sprintar não fui fiel a quem sou”, analisou. Quis a vitória em excesso, com receio de que um colega lhe tirasse a oportunidade.
Crucialmente, os colegas e o DD Grischa Niermann não o castigaram. O apoio que sentiu foi chão, não peso. “Ajudou-me enormemente não sentir frustração ou raiva de ninguém para comigo”, afirmou Van Aert.
A fome de vencer estava lá, o instinto, a chama, mas sabia que a decisão fora errada. Não embaraçosa, nem catastrófica, apenas errada.

Pressão, expectativas e a necessidade de provar algo

No arranque da época, o exterior esperava que Van Aert reencontrasse de imediato o antigo nível. Essa expectativa, admitiu, pesou mais do que percebia.
Demi Vollering saiu em sua defesa nas redes sociais, lembrando como os grandes atletas por vezes tomam decisões imperfeitas sob pressão, sobretudo quando o mundo lá fora desconhece as tempestades que gerem por dentro.
Van Aert não discordou. “Pode acontecer não quereres vencer em primeiro lugar por ti, mas mais para dizer: vejam, ainda consigo ganhar,” disse. Não por manchetes, nem por críticos, mas para se tranquilizar.
E essa necessidade de resposta cresceu à medida que não chegaram as prestações no Opening Weekend e na E3 Saxo Classic. “Sem dar por isso, talvez queiras responder a isso”, refletiu.

Redescobrir porque corre

No fundo, o fio condutor de tudo o que disse, das dúvidas da primavera à frustração do outono, foi a procura da alegria. Não conforto. Não segurança. Real satisfação.
Esse sentimento voltou em Siena, sob o pó e o caos do Giro, quando venceu apesar de nem acreditar que o dia lhe assentava. “Há poucas vitórias cujo sentimento se aproxime. Fico arrepiado ao falar disso”. disse. “Foi um período difícil que acabou por se tornar algo positivo. Tudo encaixou”.
Foi um ponto de viragem nascido de luta genuína. Mais cedo nesse Giro admitiu: “No dia cinco perguntei-me se fazia sequer sentido continuar”. Mas a vitória virou a página emocional.
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