As consequências da suspensão de
Oier Lazkano continuam a fazer eco no mundo do ciclismo. O espanhol, que foi afastado após análises anómalas no passaporte biológico, mantém-se suspenso pela
UCI enquanto o caso avança.
Mas, segundo
Brian Holm, antigo diretor desportivo da Quick-Step e uma das vozes mais respeitadas do pelotão, os sinais de alerta estavam à vista muito antes de o organismo regulador agir.
Em declarações ao
Feltet, o dinamarquês apontou o que considera ter sido uma ascensão demasiado rápida do ciclista.
“Oier Lazkano veio do nada, de repente podia fazer um pouco de tudo. É claro que pode haver razões naturais. Mas se tivéssemos de traçar o perfil de alguém suspeito, provavelmente seria ele. Consegue correr as Clássicas e subir, e eu penso: ‘De onde é que ele veio?’”
A declaração surge poucos dias depois de Lazkano ter sido dispensado pela
Red Bull - BORA - hansgrohe, apenas meses após a transferência da Movistar Team, onde os seus desempenhos excepcionais chamaram a atenção do pelotão. O espanhol protestou a sua inocência e prometeu defender-se “até ao fim”, mas o impacto da suspensão já é profundo.
“Esta não é a primeira nem a última vez que vamos ver”
Holm, conhecido pelo seu tom direto, tentou enquadrar o episódio num contexto mais amplo.
“Eles hão-de voltar. Esta não é a primeira nem a última vez que vamos ver. É claro que algumas pessoas serão apanhadas. É preciso ser ingénuo para pensar que não serão.”
Para o dinamarquês, o caso não deve ser lido como um retrocesso para o ciclismo, mas sim como um sinal de que os mecanismos de controlo funcionam.
“Alguns dirão que o desporto está pior. Eu diria que está melhor, porque alguém reage.”
A sua perspetiva é pragmática: o aperto nos controlos antidopagem faz parte de um desporto que ainda procura equilibrar o talento e a ética competitiva, décadas depois dos escândalos que abalaram a modalidade.
Lazkano teve um desempenho notável na Movistar, o que lhe valeu uma transferência choruda para a Red Bull
Dúvidas sobre a vigilância interna das equipas
Embora Holm evite acusações diretas, deixa no ar uma crítica implícita à forma como as equipas gerem os seus controlos médicos internos.
“Surpreende-me que os médicos da equipa não tenham estado mais atentos.”
O ex-diretor recordou um episódio dos tempos da HTC-Columbia, onde a suspeita bastou para agir:
“Tínhamos o (Serhiy) Honchar. O nosso médico percebeu que algo parecia estranho, de repente ele conseguia andar tão depressa. Analisaram todos os valores sanguíneos e ele acabou por ser libertado. Apesar de não termos podido provar nada. Acabámos por ir a tribunal, mas a equipa ganhou.”
Holm sublinhou, contudo, que sem acesso aos dados biológicos, é impossível fazer juízos concretos:
“É impossível dizer quando não temos os valores sanguíneos. Não sou perito e não sei qual foi a dimensão das flutuações. Mas não consigo imaginar ninguém a encobrir nada hoje em dia... Não acho que alguém esteja a fazer vista grossa. Antes pelo contrário.”
“Um choque, mas não uma surpresa”
O ex-diretor dinamarquês reconhece que a notícia causou choque no pelotão, mas não surpresa.
“Se alguém ia ser apanhado, não me surpreendeu que fosse ele, sem que eu pudesse realmente dizer porquê.”
A análise de Holm é, no fundo, um alerta sobre o estado permanente de vigilância que ainda molda o ciclismo moderno. O caso Lazkano volta a expor a tensão entre o progresso do desporto e a sombra persistente da desconfiança.
Enquanto a UCI continua a investigação e Lazkano prepara a sua defesa, o episódio serve de lembrete de que a credibilidade conquistada ao longo de anos pode desmoronar em dias e que, como diz Holm, “a ingenuidade é o primeiro passo para voltar atrás”.