Bastaram apenas três etapas da Volta à Itália 2025 para que se desenhasse um padrão claro. A
Lidl-Trek é, para já, a força dominante da primeira semana. Essa ideia foi consolidada na terceira etapa, quando
Mads Pedersen sprintou para a sua segunda vitória em três dias, recuperando ao mesmo tempo a Camisola Rosa. Num dia em que muitas equipas optaram por uma abordagem conservadora, a formação americana assumiu o controlo da corrida, aplicando a sua estratégia com eficácia e força.
A etapa, com 160 quilómetros através da montanhosa Albânia, decorreu por paisagens impressionantes, mas não deixou nada a desejar em termos de ação. Apesar do perfil apontar para um desfecho ao sprint, uma subida dura a 40 quilómetros do final fracionou o pelotão e afastou vários sprinters puros.
"Os verdadeiros sprinters foram eliminados, principalmente Kaden Groves, Sam Bennett, Olav Kooij e outros. E penso que essa era obviamente a intenção da Lidl-Trek", comentou
Johan Bruyneel no podcast
The Move. "Controlaram o final da corrida de forma incrível. A primeira etapa foi impressionante, mas esta, na minha opinião, foi ainda mais impressionante."
O sucesso de Pedersen foi construído sobre um excelente trabalho de Matias Vacek, que lançou o sprint de forma magistral.
"Chegou à frente a cerca de 800 metros do fim, o que é uma eternidade num lançamento, e fê-lo com perfeição", explicou Bruyneel.
"Imprimiu um ritmo altíssimo. Ninguém lutava pela posição, lutavam pela roda do Pedersen. E mesmo nos últimos 150 metros, ainda teve capacidade de acelerar. Isso foi determinante. Quando o Mads arranca, já leva uma bicicleta de avanço, e recuperar isso a 250 metros do fim é quase impossível."
A forma de Pedersen tem sido notável. "É uma vitória para todos. Mads Pedersen está feliz porque ganhou e tem a camisola de líder. Primoz Roglic também está feliz porque já não a tem. Parece que todos saem satisfeitos desta etapa", comentou Spencer Martin.
A Red Bull - BORA - hansgrohe, equipa de Roglic, não tinha qualquer interesse em manter a liderança nesta fase da corrida. Ainda assim, colaboraram com a Lidl-Trek no controlo da fuga, algo que Bruyneel acredita ter sido combinado previamente.
"Isto foi acordado de antemão. Pedersen queria a camisola de volta e Roglic queria livrar-se dela. Foi um cenário de benefício mútuo. Para controlar uma fuga de seis ciclistas, cada equipa usou apenas um homem."
Por que razão Roglic não quereria a camisola nesta fase? A resposta é simples. A Camisola Rosa implica responsabilidades mediáticas e compromissos que encurtam o tempo de recuperação, algo crítico numa prova de três semanas. Roglic, mais do que ninguém, sabe que o que importa é vesti-la na 21.ª etapa.
Outro elemento decisivo da Lidl-Trek foi Jacopo Mosca, que voltou a dar nas vistas depois de já ter celebrado na etapa inaugural.
"Havia uma aposta dentro da equipa: se vencessem a primeira etapa, cortavam o cabelo. No caso do Mosca, raparam apenas o meio. Pedersen participou, com a sua mulher, Elisa Longo Borghini, a assistir por vídeo", revelou Bruyneel.
A coordenação da Lidl-Trek tem sido impecável.
"Estão fortíssimos. Claramente apontaram a preparação para o início do Giro. Estas duas etapas na Albânia favoreceram Pedersen. Não são sprints puros, mas ele aproveitou-as na perfeição. O controlo da corrida, sobretudo hoje, foi excecional."
O esforço de Dan Hoole, que subiu a última montanha a 475 watts, diz tudo sobre o nível da equipa.
"As pessoas perguntam por que ninguém ataca. Mas pensem nisto: o Dan Hoole está a fazer 6 w/kg e é apenas o quinto mais forte da equipa. Como se ataca assim? Tentam, mas não vão a lado nenhum. É como tentar escapar de Alcatraz cercado."
A subida em questão, com 10,5 km a 7,5%, foi tudo menos acessível.
"Ninguém estava confortável naquela subida", disse Bruyneel. "O Wout van Aert quebrou. É claro que não começou este Giro no seu melhor."
O belga reconheceu mais tarde que não se sentia bem, mas com o dia de descanso à vista e etapas mais planas no horizonte, poderá recuperar.
Ainda assim, houve críticas à falta de movimentações ofensivas na subida. Bruyneel respondeu com dureza.
"Chamo a estas pessoas diretores de teclado, jogadores de consola e batatas de sofá. Dão opiniões de especialistas, mas isto são três semanas de corrida. Qualquer pessoa que tenha pedalado vários dias seguidos sabe o que é a fadiga acumulada."
Martin alinhou com a visão de Bruyneel.
"Estas etapas são miragens. Vemos uma subida e achamos que será seletiva, mas está muito longe do fim. Se alguém cai, toda a equipa volta atrás. E quem está na luta pela geral, acaba por regressar ao grupo."
A UAE Team Emirates também deu boas indicações.
"Estavam bem mais organizados do que na primeira etapa. Tinham quatro ciclistas à volta do Ayuso", observou Martin com ironia. "Provavelmente foi apenas uma medida de precaução para evitar acidentes na descida."
Quanto à etapa 4, os analistas preveem uma chegada em pelotão.
"Vai ser uma etapa de sprint", antecipou Bruyneel. "Todos os grandes sprinters precisam de aproveitar agora. Eu vou pelo livro: Olaf Kooij."
Martin discordou. "Vou com Mads Pedersen. Está em modo imparável."
Bruyneel reforçou o estado de forma do dinamarquês.
"Estou a lembrar-me do Paris-Nice. O que ele fez lá foi brutal, tanto a subir como a nível físico. Está num pico de forma."
Nos bastidores, a luta pela manutenção no WorldTour está ao rubro. A Astana, que no início do ano parecia condenada, está agora a quatro pontos da zona de salvação.
"Conseguiram 45 pontos UCI hoje com o nono lugar do Scaroni. A PicNic PostNL só conseguiu 10", disse Martin.
Bruyneel concluiu. "Eles estão a conseguir. No início da época pensei que não iam aguentar, mas estão a surpreender."
Com mais uma etapa ao sprint marcada para terça-feira, o Giro já está cheio de histórias e subtramas.
"A Lidl-Trek é a equipa deste início de Giro, de longe a mais impressionante", resumiu Bruyneel.