Oliver Naesen, aos 33 anos, continua a ser uma figura de referência no pelotão WorldTour. O belga da Decathlon AG2R La Mondiale é um dos últimos especialistas em clássicas do ciclismo moderno: um corredor de caráter, resistente ao empedrado e com uma visão de corrida que o tornou capitão de estrada e mentor natural dentro da equipa francesa.
Depois de quase uma década na formação, Naesen observa de perto como o desporto mudou, e como o profissionalismo atingiu um nível sem precedentes.
“Costumava ser muito mais orientado para a família. Ainda se podia convencer alguém a entrar na equipa, mas agora estão a ser implementadas decisões duras e comerciais. As coisas são mais exigentes, e isso nem sempre é fácil, mas reflete-se nos resultados”, afirmou o belga ao Het Nieuwsblad.
Desde a entrada da Decathlon como patrocinador principal em 2024, a estrutura sofreu uma revolução. Com Dominique Serieys a assumir o cargo de diretor-geral, a mentalidade empresarial passou a dominar a estratégia desportiva.
“No ano passado, a Decathlon nomeou um novo diretor-geral, um homem de negócios. Em 2024 vencemos oito vezes, este ano temos de acabar com mais de vinte vitórias, e praticamente com o mesmo núcleo. Isso abriu-nos os olhos: se priorizarmos o desempenho e não cortarmos caminho, isso traduz-se em resultados”, explicou Naesen.
A exigência como nova norma
Embora o belga reconheça que o ambiente se tornou mais competitivo e orientado para metas, vê esse rigor como algo positivo.
“Pode pensar-se que expressar abertamente essas ambições coloca uma pressão pouco saudável sobre os rapazes, mas na verdade acho que é uma coisa boa. O desporto de elite é simplesmente um mundo diferente”, comentou.
Aos 33 anos, Naesen já não é o líder absoluto das Clássicas como em 2017 ou 2018, mas continua a ser uma peça tática essencial da AG2R, valorizado pela experiência e pela capacidade de orientar os mais jovens.
O impacto da Decathlon: orçamento e qualidade
Para o belga, a entrada da Decathlon foi muito mais do que um novo patrocinador, foi o ponto de viragem da equipa.
“No passado, a equipa tinha de fazer face às despesas. Se queríamos certos componentes para as bicicletas, como as rodas, escolhíamos uma determinada marca porque pagavam mais, mesmo que o produto fosse de menor qualidade”, recorda.
Hoje, a realidade é diferente. A força económica e industrial da Decathlon permite negociar de igual para igual com os fornecedores, algo que poucas equipas conseguem.
“Se a Decathlon chamar essa marca de rodas para patrocinar a equipa, há uma grande probabilidade de se tornar o maior cliente dessa empresa, porque depois colocará essas rodas em todas as suas bicicletas de loja. Por isso, a marca tem todo o interesse em fornecer centenas de rodas à equipa. É uma influência que as outras equipas não têm.”
Naesen continua a ser um dos melhores especialistas em clássicas. @Sirotti
A nova era da Decathlon: internacional e moderna
Além do salto financeiro e tecnológico, Naesen destaca uma mudança cultural profunda.
Quando chegou à equipa, em 2017, o núcleo era quase inteiramente francês, centrado em Romain Bardet e nas ambições das Grandes Voltas. Hoje, a Decathlon AG2R La Mondiale é um projeto mais aberto e cosmopolita, com ciclistas de várias nacionalidades e perfis.
“A equipa quis livrar-se da reputação francesa para ser atraente para os ciclistas estrangeiros. Não é que haja algo de errado em falar francês, mas pode ser um fator limitativo no recrutamento de bons corredores”, explicou.
“Há alguns anos, o Brent Van Moer esteve perto de se juntar à equipa, mas disse-me que não estava interessado porque o seu francês não era suficientemente bom.”
A chegada de nomes como Olav Kooij, Tiesj Benoot e Matthew Riccitello simboliza essa nova fase.
“Ainda falamos ocasionalmente em francês com os membros da equipa, mas quando o chefe está presente, não se deve começar em francês. É bom que os ciclistas neerlandeses se juntem à equipa”, acrescentou o belga.
Uma equipa com ambição e juventude
Naesen mostra-se particularmente entusiasmado com a chegada de Olav Kooij, que será uma das novas figuras de referência da equipa em 2026.
“Ele só tem 24 anos, mas já é um sprinter de classe mundial. Este tipo nem precisa de melhorar nada para ganhar vinte corridas com o apoio total da equipa. Isso já é metade da época.”
Com a experiência de Naesen e a nova geração liderada por Kooij e Benoot, a Decathlon AG2R La Mondiale parece ter encontrado o equilíbrio entre a tradição e a modernidade, um reflexo do próprio percurso do belga, que aprendeu a adaptar-se sem perder a identidade.