Ao longo da sua ilustre carreira, Sean Kelly conquistou praticamente tudo o que havia para vencer - à exceção de um Monumento: a Volta à Flandres. Foi a única corrida que lhe escapou no caminho para um potencial Grand Slam no ciclismo. Agora, já na condição de comentador e analista, o irlandês acompanha com fascínio a trajetória de Tadej Pogacar, que poderá alcançar o feito que ele próprio não conseguiu.
"Nos últimos 30 anos, vimos corredores excelentes em Grandes Voltas, mas praticamente todos tinham um ponto fraco”, escreve Kelly na sua coluna para o Cyclingnews. “Mesmo na era de Bernard Hinault, havia trepadores que ele não conseguia acompanhar nas montanhas".
Com Pogacar, o cenário é outro. “Ele não tem pontos fracos - consegue disputar contrarrelógios com os melhores, aguenta-se no plano e ao vento, desce como poucos... domina todos os terrenos. Onde é que o podemos pôr em dificuldades? Não há resposta. Simplesmente não há esse lugar".
Kelly sublinha que se a excelência de Pogacar se limitasse às corridas por etapas, já seria notável. Mas o esloveno eleva a fasquia ainda mais: “Nas Clássicas, enfrenta especialistas dos paralelos e consegue deixá-los para trás também. É uma loucura o que ele faz. Estamos perante um talento verdadeiramente à parte".
A análise do irlandês à Volta à Flandres é clara: “Mesmo antes do ataque final, o que me impressionou foi o modo como ele impôs ritmo, como manteve todos no limite sem nunca ele próprio vacilar. Estava no controlo total — puxava quando queria, geria quando precisava, e fazia os outros sofrer a cada aceleração. Quando chegou a altura crítica, já sabíamos: ia ser ele contra Van der Poel. E como disse na semana passada, o holandês teria dificuldades no Oude Kwaremont. Foi aí que Pogacar o destruiu — era inevitável".
A Paris-Roubaix, marcada para este domingo, promete ser o maior teste da carreira de Pogacar até ao momento. Ao contrário da Flandres, a ausência de subidas longas e a predominância de setores planos e empedrados joga claramente a favor dos especialistas como Van der Poel ou Van Aert.
“Roubaix é uma corrida completamente diferente da Flandres”, salienta Kelly. “Será mais difícil para ele fazer a diferença. Nos troços planos e nos paralelos, Van der Poel e Van Aert conseguem manter-se muito mais facilmente na roda, ao contrário do que acontece numa subida como o Kwaremont".
Ainda assim, Kelly deixa um aviso: “Com o Pogacar, tenho sempre receio de fazer previsões. Porque, com ele, tudo é possível. E não me admiraria nada se o víssemos vencer em Roubaix no próximo domingo".